[15] Hempovão: Gandhia, dia 27 de fevereiro de 2010

enviado pelo leitor Bruno Breda

O relógio já marcava 15h00, e a entrevista para um emprego parecia que nunca teria fim. Só faltava meia hora para começar a concentração do Gandhia quando eu consegui sair à caminho do MASP.

Durante o trajeto a ansiedade por chegar logo ao encontro era grande. Apesar de não estar de cabeça feita, fiquei vislumbrando um mundo onde eu poderia ter fumado um badégo enquanto esperava a minha condução para o Gandhia no ponto de ônibus. Afinal de contas, eu estava a caminho de um debate a favor da legalização da maconha, um exercício de livre expressão.

Quanto mais eu chegava perto do MASP, mais a ansiedade apertava. Foi aí que vi uma mulher que aparentava seus 50 e tantos anos, vestida com uma blusa que tinha folhas de maconha como estampa. Já pensei “Com certeza não serei o único no movimento.”

Enfim cheguei ao MASP: quando me deparei com aquela visão, achei que tinha errado de lugar, e que ao invés de um ato pacífico seria um ataque terrorista do PCC que aconteceria ali.

Blazers da Força Tática exibiam seus brutamontes com suas boinas e empunhando rifles além de Patrulhas da Polícia Militar rondando. Até a Guarda Metropolitana fazia ali a sua presença.

Apertei o passo até o fundo do vão livre, esperando encontrar um sujeito com diversos explosivos presos ao seu corpo e um controle remoto na mão. Mas o que encontrei foram os manifestantes do Gandhia, que portavam perigosíssimas rosas brancas assassinas em volta de uma ameaçadora bandeira branca, orégano radiotivo, cartolinas AR-15 e canetões coloridos prestes a explodir.

E de repente a liberdade de expressão virou crime! As rosas precisaram ser recolhidas, as cartolinas não podiam se quer ser abertas para escrevermos cartazes. E como que num passe de mágica, o orégano se tornou a erva do demônio. A palavra de ordem era: NÃO SE MANIFESTEM!

A imprensa se divertia com tudo aquilo, buscando flagrar um baseado para divulgar num Brasil Urgente da vida. E aí percebemos que vivemos numa democracia onde a liberdade de expressão só é permitida no que não afeta o interesse do Estado.

Mas o esforço não foi em vão. Mostrou que tem gente na militância disposta a ir para as ruas exigir seu direito de se expressar, e de decidir por conta própria o que é prejudicial para si ou não. Despertou em muitos o desejo de ter comparecido no movimento, e de comparecer nos próximos para ter suas vozes ouvidas.

O mais interessante foi ter encontrado aquela mulher, de seus 50 e tantos anos, dando entrevista para a câmera da Band. Trata-se de uma mulher muitíssimo bem humorada, condinome Cris Doidona, que fuma cannabis a 37 anos. Dizia ela para as câmeras: “Fumo a 37 anos, não tenho artrite, não tem problemas com pressão, não tenho glaucoma..”

Flagramos a hipocrisia. Para quem não sabe, ali no MASP não é nada incomum ver pessoas fumando maconha, inclusive em horário comercial. E a polícia sabe disso. Mas quando rola uma reunião para fumar orégano, a coisa fica feia.

Depois que a poeira baixou e a presença militar se extinguiu, conheci ali pessoas, conversando sobre a legalização, trocando informações. Até que o debate teve uma pausa, pois particularmente entramos no consenso de que era hora do fumacê. Logo ali atrás do próprio MASP, o ritual dichava-aperta-acende foi cumprido com menções honrosas.

No final das contas o Gandhia não aconteceu como o esperado, mas o dia terminou com ganja... pelo menos para mim.

As fotos são do Unzinho.com

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