quinta-feira, 20 de setembro de 2012

Carolina, 23 anos, SP – Candidata 011 ao Miss Marijuana 2012!

1] Você trabalha ou estuda? Qual sua profissão ou que tipo de atividade social exerce?
Curso o 12º (isso mesmo, sexto ano) de Letras na Universidade Estadual Paulista – UNESP, campus Araraquara. Sou professora de inglês numa escola particular e dou aulas para todos os níveis e idades.
2] Já fumou maconha? Como se deu essa experiência e o que isso significou para você?
Fumo maconha diariamente há aproximadamente cinco anos. Desde a adolescência tive curiosidade de saber os efeitos de tão comentada e veementemente proibida droga, entretanto, sempre fui consciente de que esse tipo de experiência deveria acontecer quando atingisse certa maturidade e discernimento. Portanto, só passei a consumir maconha com freqüência quando eu já podia arcar com os custos que esse hábito me traria e quando não mais dependia de dinheiro ou aprovação dos meus pais, que como a maioria das famílias mais conservadoras, são contra o uso da maconha por não conhecerem os reais efeitos e usos da planta e serem vítimas das armadilhas da mídia. Assim, quando deixei a casa dos meus para morar numa república e obtive minha própria fonte de renda trabalhando, passei a consumir maconha diariamente. Antes de comprar minha própria erva, consumia todos os dias nos intervalos das aulas da faculdade, junto com os amigos mais próximos. Fumo diariamente para usufruir da sensação de relaxamento após um dia de atividade intensa. Também fumo como momento de socialização, junto com amigos, pois a noite é o momento do dia em que podemos nos encontrar sem mais obrigações a cumprir. Essa experiência, hoje em dia, tornou-se fundamental, pois há momentos de tensão que são minimizados pelos efeitos da erva, e mesmo momentos simples como admirar o pôr-do-sol, cozinhar um prato diferente, ler um livro, ver um filme, ir para uma cachoeira ou simplesmente conversar com os amigos tornam-se muito mais interessantes sob efeito da Cannabis.

3] Qual a sua opinião a respeito da mudança na legislação brasileira especificamente em relação à Cannabis?
Acredito que no Brasil vivemos numa lamentável situação de atraso no que diz respeito a políticas sobre drogas. Não creio que esta deva basear-se em campanhas de combate ao uso de todas as drogas ou prisão dos consumidores, pois há fatores mais importantes por trás da proibição. Inicialmente acho fundamental que comecemos a discutir sobre o assunto sem tratá-lo como tabu. Drogas sempre existiram nas sociedades de todas as épocas e sempre existirão. Portanto, não devemos fingir que elas não existem ou que são algo maligno, como grande parte da mídia transmite. Precisamos ampliar o debate visando mostrar para a sociedade brasileira que as drogas são diferentes entre si e que cada uma apresenta seus efeitos e riscos, o que deixaria evidente que a maconha não oferece riscos aos consumidores tampouco à sociedade. É importante desmistificar a idéia dos mais conservadores a respeito da maconha, pois estes imaginam que ela seja tão prejudicial à saúde quanto crack ou drogas mais pesadas e que causam altos graus de dependência. É importante também ressaltar que drogas muito mais nocivas circulam livremente pelo mercado apenas por garantirem altíssimos lucros a indústrias e ao governo, é claro. Afinal, drogas como o cigarro e remédios contra depressão são muito mais perigosas e são liberadas porque proporcionam lucros exorbitantes ao governo e aos produtores. Portanto, o primeiro passo para uma mudança na legislação é uma mudança na cultura e na visão do brasileiro sobre a maconha. Precisamos mostrar de uma vez por todas que consumidores de Cannabis não são marginais; não abandonam suas obrigações profissionais, sociais e de qualquer outra natureza; não recorrem ao tráfico porque são parte dele, mas porque são vítimas de leis arbitrárias contra a planta; precisamos mostrar que os consumidores de maconha estão espalhados por todo o mundo, em todas as profissões, são competente, inteligentes, normais e não “maconheiros vagabundos” como se diz por aí, entre aqueles que não detêm discernimento e capacidade intelectual para enxergar a real situação da maconha no Brasil e no mundo.
Depois de desfazermos o tabu acerca do que a sociedade chama de “maconheiro”, é importante que se estabeleça e diferença entre o tráfico e o consumo para que possamos iniciar uma discussão sobre a legislação pertinente. O primeiro passo para isso é a descriminalização do uso de maconha. É inadmissível que sejamos considerados criminosos por fumarmos um baseado em casa, ou por plantarmos um pé. Portanto, é fundamental que o consumidor seja tratado com um consumidor de bebidas alcoólicas, por exemplo. Daí, surge a necessidade da legalização, pois a partir do momento que entendermos que maconha não é crime, muitos podem confundir e passar a usar de maneira descontrolada e desrespeitosa, pois assim como não podemos fumar cigarro em qualquer ambiente, devemos respeitar aos outros e consumir a maconha também com consciência. Assim, leis razoáveis acerca de onde, quem, quanto de maconha podemos usar devem ser criadas, visando a qualidade da erva que será consumida, o fim do tráfico, mas também o controle sobre o uso, afinal devemos cuidar para que crianças e adolescentes não tenham contato precoce com quaisquer drogas.
Enfim, acredito que é um longo caminho, que começa na mudança da cultura e só então será seguida pela mudança na legislação, que é essencial para que a sociedade passe a ver a maconha como uma planta e não como um crime.

4] Você já participou da Marcha da Maconha? Como foi?
Não.

5] Já tentou plantar Cannabis? Qual sua opinião sobre o cultivo caseiro?
Iniciei o cultivo caseiro de Cannabis esse ano. Moro numa república de estudantes e temos em casa quatro pés. Dois deles vieram para minha casa através de um amigo agrônomo, que as trouxe já em forma de mudinha, e hoje cresce a olhos vistos, mas ainda sem brotos. Temos outros dois pés provenientes de sementes auto-florescentes (Speed Devil), que já estão brotando.
Acho que a melhor alternativa para que os consumidores evitem recorrer ao tráfico é o cultivo caseiro. Não se causa nenhum dano a ninguém, garantimos uma erva de qualidade e não corremos riscos de envolvimento com o crime. O único problema é que enquanto as plantas não florescem, ainda temos que comprar maconha de baixa
qualidade e alto custo.

6] Quais foram os últimos três livros que você leu? E qual está lendo atualmente?
“O Amor possível”, entrevista com José Saramago; “O discurso fundador”, livro com artigos sobre análise do discurso, que retrata como algumas sentenças, tabus e opiniões se consolidam como verdadeiros na sociedade brasileira, tudo isso através da linguagem; “O evangelho segundo Jesus Cristo”, no qual José Saramago desconstrói a história de Jesus, contando-a como se este fosse uma pessoas comum e não um salvador, como no cristianismo. No momento estou lendo “A song of Ice and Fire”, os livros que inspiraram a série “Game of Thrones” e mais livros sobre análise do discurso para embasar minha monografia.

7] Porque você acha que merece ser eleita a Miss Marijuana?
Porque pra mim, fumar maconha não é ser descolado, não é ser mais legal, nem tornar-se aceito em algum grupo. Para mim, fumar maconha é um jeito de aprofundar meus pensamentos acerca de mim mesma, do mundo e da minha relação com ele. É a busca da minha paz, da harmonia entre eu e tudo o que me cerca, é uma forma de compreender as coisas de um ângulo muito mais complexo, de ver além do que nos é mostrado e, assim, alcançar uma compreensão da vida que nos leva a ser mais felizes, enfrentar o mundo com mais leveza. Acho que esse é o espírito de quem fuma maconha: se sentir bem, cultivar o bem, afastar todas as más energias. Estar bem consigo, estar bem com os outros. Acho que eu poderia ser Miss Marijuana porque eu saberia defendê-la sem distorcer seu uso, não faria apenas uma apologia desmotivada. Além disso, tenho como objetivo de vida - e comecei dentro da minha casa, apesar de sofrer pesadas repressões - mostrar para a sociedade que a maconha não é um mal, mas um recurso para lutarmos contra vários males: desde os mais simples como fome, insônia, até mais complexos como epilepsia, fibromialgia e males psicológicos que muitos ainda tratam com remédios perigosos. Além disso, acredito que a miss marijuana não deva ser eleita por ser apenas bonita, porque obviamente eu perderia, vista que não um padrão comum de beleza. Ser bonita qualquer uma pode, e então que vá participar de um concurso de beleza qualquer. O importante é ter estilo, atitude, agir de maneira coerente com o discurso pregado. Acho que a beleza é um valor muito fraco, muito efêmero, muito insignificante perto da personalidade e do caráter. Tenho muito mais do que corpinho bonito pra mostrar. Ah, e também não sou tão feia vai! hahaha

8] Diga sua música favorita para a hora do chá verde.
Gosto muito de ouvir SOJA em todos os momentos do dia, especialmente quando estou fumando, mas como fumo com muitos amigos, os sons que ouvimos variam bastante. A preferida de todos pra começar a sessão fumaça é sempre Summer Breeze, do SOJA, porque moramos numa cidade que parece sempre verão e sempre estamos cercados por essa brisa boa. Mas uma música que curto muito ouvir fumando e que, a propósito, ouvi pela primeira vez no Hempadão é “Grassoline”, do Poker Face. A música é bem chapante e o clipe é muito inspirador também! Hehe!

9] Desde quando você conhece o Hempadão? O que mais você curte no blog?
Conheço o Hempadão há uns 2 ou 3 anos, não me lembro exatamente. Gosto do Cipadão, das reportagens, vídeos e notícias esclarecedores que me mantêm informada dos debates sobre a maconha ao redor do mundo. Também curto os sons e as zueiras que postam no site, são sempre inspiradores. Enfim, só de haver esse espaço para compartilhamento de informações e de livre manifestação, já é ótimo!

10] Alguma vez você sofreu repressão policial por fazer uso de substância ilícita? Como foi?
Não, porque geralmente consumo em casa, ou em eventos que não são policiados. às vezes porto maconha, mas nunca fui repreendida pela polícia porque moro numa cidade tranqüila, com poucos policias em vigia e sou mulher, né?! E dificilmente a polícia revista ou intercepta mulheres. Tenho amigos e vizinhos que já foram repreendidos e tiveram sérios problemas com a família por cauda disso, mas todos sempre tentaram defender com dignidade sua posição.

11] Acha que o usuário de maconha ainda sofre muito preconceito no Brasil? Você já passou por isso?
Com certeza! Nosso país abriga preconceitos descabidos de todos os tipos e não seria diferente com o usuário de maconha. Geralmente somos vistos como marginais, vagabundos, etc. Sofro preconceito dentro da minha família. Recentemente minha mãe me perguntou se eu já havia fumado e com naturalidade respondi que sim, pronta para contar a ela minhas experiências e esclarecer que apesar de fumar maconha, levo uma vida normal, responsável, trabalho, estudo e sou uma pessoa de bem. Ela, por outro lado, ficou desesperada, achando que já seria um caso de internação, ou que eu poderia ser presa a qualquer momento. Foi bem difícil. Ela ficou triste e não para de encanar com isso. Acabei desistindo, porque ela é muito conservadora e não vai entender minha posição, então acabei falando que fiz uma vez só, porque eu quis e que essa foi minha escolha pessoal, que ninguém deveria se intrometer nisso. Não escondo minhas preferência e opiniões em lugar algum, mas tomo um pouco de cuidado com o trabalho, pois como sou professora e lido inclusive com crianças não posso ficar dando palas tipo “4:20” no facebook, mas não deixo de compartilhar notícias sobre as discussões ao redor do mundo, nem de postar frases ou músicas que me inspiram, mas que são consideradas por muitos como “coisas de maconheiro”. Não tenho nenhum pudor em assumir minha posição em relação à maconha ou qualquer outro assunto polêmico, sejam mamilos, ou aborto.

12] Você defende a legalização de todas as drogas? Por quê?
Não. Não estamos culturalmente preparados para a legalização de nenhuma droga. A população não consegue compreender sequer os efeitos da maconha, que é considerada uma droga leve, quem dirá drogas mais pesadas. Também não defendo a legalização de todas as drogas porque infelizmente muitas delas são sim prejudiciais, fazem o usuário perder a consciência e estes podem causar acidentes ou situações embaraçosas por não serem capazes de controlar a si próprios por causa dos efeitos da droga. Mas acredito que o ponto principal que me faz ser contra a legalização de todas as drogas é que muitas delas causam dependência e nosso país não tem políticas nem sistemas de saúde adequados para tratar os dependentes. Isso somente causaria ainda mais problemas de saúde, criminalidade, desemprego, preconceito, afinal aquilo que chamam de “viciado” está sujeito a tudo isso se não tiver respaldo do governo e da sociedade para se livrar do vício que o destrói. Defendo a legalização da maconha, pois não a vejo como responsável por dependências nem crimes que envolvam a perda da consciência do usuário, por exemplo.

13] Qual sua opinião sobre drogas como álcool e crack?
Sou a favor do livre arbítrio e acredito que as pessoas são responsáveis pelas escolhas que fazem. Infelizmente, como eu já disse, algumas pessoas são mais suscetíveis a tornarem-se dependentes e, assim, acabam perdendo o controle do consumo das drogas e agindo de maneira deturpada
Acho, portanto, que o álcool deve sim ser visto como perigoso, pois muitas pessoas causam graves acidentes por estarem sob efeito de bebidas alcoólicas, logo devem ser punidas de acordo com o que fazem. Gosto e consumo muito álcool, mas sei em quais situações posso fazer isso e, principalmente, até que ponto minha embriaguez afeta minha conduto e interfere na vida alheia.
Já o crack deve ser visto com um problemas de saúde pública, pois os usuários muitas vezes já não tem mais controle sobre a própria vida sobre suas escolhas e precisam de ajuda.
Entretanto em nenhum dos casos os dependentes devem ser vistos como marginais, mas como pessoas que precisam de ajuda. Quando o caso for apenas de consumo, não vejo problema desde seja moderado e sem maiores danos ao usuário.

14] Em quanto tempo você acha que a maconha vai ser legalizada no Brasil? Por quê?
Acho que ainda temos um longo caminho até a legalização da maconha e não sei se viverei para ver isso. Gostaria que isso acontecesse em no máximo dez anos, mas não acho possível, pois vivemos num país muito hipócrita e voltado para os ganhos materiais. Mudanças que prevêem novos rumos para a cultura e para a economia não são muito bem vindas no Brasil, portanto acredito que a maconha só será legalizada dentro de no mínimo 20 anos, se for. Torçamos para que eu esteja errado e meu pessimismo seja substituído por inovações e maior aceitação da marijuana, que não merece o status ruim que carrega!