segunda-feira, 14 de setembro de 2009

[#14] FENACUCA - Prosa: Banal Sensacional!

Domingo. Trabalho em dia. Contas pagas. Na universidade, aula dada, aula estudada. Com um desvio de uns 2 dias, convenhamos. Solteiro. Farto de relações vazias, farto de relações cheias de coisas. Bom filho. Visitara seu pai no aniversário de 60 e poucos anos. Enchia de orgulho os dois velhinhos. Olha no relógio e vê: 4h05 da tarde. Ele só tinha um defeito social. Adorava uma flor. Por vezes, via a Divindade nela, por vezes, com ela. E esse era o momento exato para ver seu defeito social.

Quinze minutos depois, havia preparado seu ritual de adoração. Silenciosamente desejou a paz, se unindo a muitos outros defeituosos sociais em harmonia, igualdade e paixão. Com o fim do ritual, já repleto de paz, graça e silêncio, saiu com um grande amigo, igual adorador da sábia flor. Iam ao observatório da universidade, o ponto mais alto da região, assistir um espetáculo: Uma bola de fogo gigante, parada, flutuando no nada, que finge se esconder na linha do horizonte!! – comentavam, animados, a sinopse.

Na portaria da universidade, uma sensação de borbulhamento seco subiu pela coluna dele. O horrendo uniforme azul escuro não podia esconder a graciosidade da perigosamente cheia-de-curvas porteira. Sorriso provocativo e jovial, pele morena e olhos divertidamente atrevidos, que há muito encontravam desejo nos olhos dele. Muito atento aos detalhes ele já vira, com a deliciosa sensação mista de satisfação e desejo, a bela morena, de seios e coxas tenras e cintura fina, mordendo delicadamente seus lábios ao vê-lo, sinal que corretamente interpretara: o desejo era recíproco.

Oi! – exclamou a delicia encarnada, para discreto delírio interno dele. Quanta audácia! A coragem da atitude dela fez pulsar vida nele. Ainda imerso no ritual, não reagiu. Cruzou a portaria, respondendo a audaz investida apenas com um olhar vago…

Eu não acredito que você não vai lá, lezado! – Exclamou seu amigo. Já não tivemos suficientes conversas e conclusões sobre como o presente deve ser vivido!?

Os dois amigos dividiam uma doença, uma farpa mental que sempre doía: o não entendimento do tempo. Sabiam que o futuro, se existisse tal coisa, era incalculável. No passado só lembranças, distorcidas por uma mente sagaz e sorrateira, sobre a qual aprendiam, incentivados pelos constantes rituais pagãos de adoração a tal flor. Sempre concluiam que o presente, essa impalpável fração do tempo, continha todos os segredos da existência. Combinaram não mais adiar decisões que deviam ser tomadas no presente. Mas estava chocado – jamais, em todas as trocas de cortejo, haviam passado ao verbal.

Eu, hã… Peço o número dela na volta… - gaguejou, não acreditando no dizia. Atento a sua própria mente, viu a erupção de pensamentos. Foi se desapegando de vários deles, mas titubeou no último: “Como se beija alguém com a boca seca assim?”. Logo estava repleto de certezas novamente. Não posso fazer nada com a boca seca assim… Vou beber água e voltar. Pedirei um beijo e o telefone, se ela não gostar, peço desculpas e o telefone. Será infalhível! – Falou com firmeza, convecendo a si e a seu amigo. Mas sem perceber, cometera o grande erro: adiara a decisão do presente…

Melhor hidratado, divertia-se observando as emoções formigando na barriga, os pensamentos caóticos indo e vindo ao se aproximar da portaria. A coragem que juntara variava, não sabia ao certo o que fazer. Com o cotovelo para fora do carro, se sentia um rapper ostentador, com ele dentro, se sentia um tiozinho. Colocava então só metade do cotovelo pra fora e, vendo a total falta de sentido disso, ria-se… Quando ela já estava próxima o suficiente para ter, novamente, suas curvas apreciadas pelos olhos dele, outro carro entrou pela portaria, no sentido contrário. Em seu interior um cara sem atrativos, exceto um: um cachorro no banco traseiro. Ele amava cães, mas esse, odiou: ao atravessar a portaria, obtendo um retumbante virar de costas dela, ouviu ainda o golpe de misericórdia: Ohn, que fofinho!! Como chama?? Trouxe pra passear?!
Saiu, invisível aos olhos dela. Se sentia um idiota (e devia parecer um, pois seu amigo sufocava de rir) mas, como que tomado no colo por ela, sua amada flor, ouviu sua voz que, embora irônica, trazia sabedoria:

Momento presente… Achei que você entenderia mais rápido. Mas tudo bem. Seu sofrimento agora pertence ao passado, não se preocupe. Você a verá outro dia. Quando se encontrarem novamente, você terá o que busca: mais um relacionamento vazio…

Nome: Rodrigo Souza
Idade: 23 anos
Profissão: Programador
Campinas - SP

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