quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Palavras Alucinantes: Enteógenos, Psicodélicos e outras Realidades Semânticas – Parte 1!

[Portas da Percepção Ed. #143]

por Fernando Beserra

To fathom Hell or soar angelic,/ Just take a pincho of psychedelic

 

Parece não existir consenso: do pesquisador, passando pelo usuário, atravessando o território do curioso, até chegarmos ao proibicionista, ninguém parece ter uma fórmula irrefutável ou ideal para definir uma classe misteriosa de substâncias psicoativas, que pode levar do céu ao inferno, e a realidades muito distintas das habituais.

 

Os termos usados para tentar uma definição são muitos! D. Johnson utilizando o termo de H. Osmond e dos americanos A.Hoffer e J.Smythies popularizou o péssimo termo alucinógeno. Este vocábulo nos leva a pensar que o consumo destas plantas ou substâncias levaria a uma alucinação no sentido psicopatológico, produzindo uma “visão de adoecimento” do uso tradicional destas substâncias, ou seja, um etnocentrismo sem tamanho! Para o ocidental focado na razão é simples e cômodo ver os povos indígenas transformados, através de uma retórica tão tosca quanto absurda, em doentes ou toxicômanos.

 

 

Claudio Naranjo, em “Viagem para a cura: narco-análise e psiquiatria” propôs denominações como sensibilizadores (felling enhancer) ou onirógenos (fantasy enhancer) para estas substâncias (apud Henrique Carneiro). O próprio Richard Evans Schultes (Carneiro, 2002), autoridade na área, considera que a multiplicidade de termos deriva do desconcertante objeto em questão, para o qual o termo alucinógeno não dá conta.

 

O antropólogo Jeremy Narby escreve que: “etimologicamente, hallucinari significa em latim ‘errar com seu espírito, divagar’ (...) É recentemente no século XV que a palavra hallucinari adquiriu o sentido pejorativo de equivocar-se”

 

Na mesma linha de abordagem se encontra o termo psicotomimético, conceito derivado do século XIX do francês J.J Moreau de Tours (Stafford, 1983). Tours foi “o primeiro a levantar a esperança que produtos químicos poderiam produzir insights em direção ao alívio da doença mental” (op.cit, p.7). Com este termo supõe-se que os enteógenos produzem uma cópia ou mimese da psicose, entretanto, no uso de enteógenos o usuário mantém uma consciência que se encontra ausente na, assim chamada, “crise” psicótica. Outro fator a ser considerado é que dificilmente uma condição chamada psicótica leva a experiências visionárias tomadas pelo sujeito que participa da experiência como profunda modificação positiva em sua vida, o que é relativamente comum no caso dos enteógenos.

 

Para não nos limitarmos as palavras e argumentos dos proibicionistas, não é de hoje que pesquisadores procuram termos que expressem o mistério. Em 1924 o pesquisador Louis Lewin propôs o termo “Phanthastica”, procurando escapar as visões etnocêntricas em voga. A classificação geral das substâncias psicoativas de Lewin fazia cinco distinções categóricas: 1) Euphorica (ópio e seus derivados, cocaína), Phantastica (mescalina, maconha, meimendro, etc.), Inebriantia (álcool, éter, clorofórmio, benzina, etc.), Hypnotia (barbitúricos e outros soníferos) e Excitantia (café e cafeína, tabaco, cat, cola, etc.).

 

Mas, queridos leitores, foi em meio a uma épica batalha poética que surgiu um dos mais inovadores termos ainda hoje utilizados: psiquedélico!

 

No decorrer das discussões sobre a inadequação do termo “alucinógeno” Humphry Osmond trocou algumas cartas sobre nomenclatura com Aldous Huxley. Numa carta de 1956, Osmond propôs a Huxley a utilização do termo psiquedélico para referir-se a mescalina e as substâncias relacionadas (Ott, 2004). Huxley, que tinha problemas de vista, confundiu a palavra por psicodético e, em sua proposta a Osmond em 30 de março de 1956, propôs fanerotime (aquilo que se faz manifesto) como alternativa. Osmond iniciou um duelo lingüístico com o inglês, respondendo a Huxley com a seguinte poética:
Para penetrar no inferno ou ter um vôo angélico,/ simplesmente tome uma pitada de psiquedélico (“To fathom Hell or soar angelic,/ Just take a pincho of psychedelic”).

 

Ao que Huxley respondeu: “Para que este mundo trivial seja sublime/ Tome meia grama de fanerotime (‘To make this trivial world sublime/ Take a half a gramme of phanerothyme’)”.

 

Finalmente em 1963 o termo psychedelic ganhou as ruas, sendo popularizado pela publicação The Psychedelic Review fundada por Timothy Leary, Ralph Metzner e Humphry Osmond. As críticas a palavra: “psiquedélico” e as novas palavras propostas nesta “Guerra das Palavras” (e também de realidades!) traremos a discussão semana que vem!

 

E você, leitor, qual palavra acha mais adequada?

8 comentários:

  1. Psiquedélicos acho bem apropriada. Assim como Enteógenos e onirógenos. Entre psiquedélicos e enteogenos acho que são relativos a crença de cada pessoa. Uma que acredita mais no divino e que enxerga tais substâncias como remédio para alma o mais apropriado seria enteógenos diferente das pessoas que enxergam tais substâncias como uma forma de expandir e acessar áreas pouco acessadas da psique, que agora o mais apropriado o termo psiquedélicos(eu acho, talvez esteja falando besteira).

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  2. http://legalizamaconha.blogspot.com


    legalização já

    http://www.youtube.com/watch?v=G_6b-HSFG88

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  3. Acho que tem razão sim Higor. É uma distinção que algumas pessoas acabam fazendo.

    Infelizmente o termo mais usado ainda é "alucinógeno", especialmente pela mídia e pela psiquiatria.

    Abç

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  4. Eu já hávia saido da página quando me veio na cabeça a palavra PSIQUEÓGENOS. Mas eu dei uma pesquisa, e vi que não faz muito sentido.

    Então pensei em Psiquentógenos.
    O que acham?
    viajei de mais?? uhsuhasuasuhas

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  5. rs.

    Samuel,

    Psiquenteógenos acho que fica muito longa a palavra. A palavra seria uma mistura de:

    Psique - alma, mente;
    Enteo - en(theos) - divino interior ou transportado pelo divino;
    Genos - geração

    Então não sei bem o que daria no final..

    Existe um termo interessante nestas misturas que tem sido mais usado em alguns países na Europa, mas que ainda não é tão popular, que é "Enteodélico". Semana que vem vamos continuar a conversa :)

    Mas achei legais as idéias. É isso mesmo, o importante é refletirmos sobre estes termos pelas perspectivas que eles permitem, para a gente ficar menos inconsciente sobre as determinações políticas.

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  6. psicodélico é um termo mais abrangente; enteógeno depende mais da intenção do que da substância.
    você pode utilizar tabaco como um enteógeno, e LSD ou DMT como recreacional...
    sendo que o princípio ativo de um dos enteogenos mais fortes é o DMT.
    Portanto, creio que o Psico"hedonista" utiliza-se de psicodélicos e os psico"nautas" utiliza enteógenos.
    E não me venha com a balela de que a intenção nao modifica a substancia. Somente o ato de observar um átomo muda seu comportamento - por isso a física quantica é tão dificil de ser abordada...
    um abraço!

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