[Ed.#123] Portas da Percepção: Os Arquivos Voadores de Timothy Leary!

por Fernando Beserra

 

Quem mais que ele, que foi apresentado pelo presidente Nixon como “O homem mais perigoso da América” pode ter nas gavetas dos dossiês os nomes de Allen Ginsberg, Cary Grant, Jack Kerouac, Carlos Castaneda, Charles Olson, Gordon Liddy e muito do que a geração Beat representou de poetas, escritores e cineastas? Seu ponto comum: o LSD. Este homem é Timothy Leary (1920-1996), psicólogo da Universidade de Harvard (até 1963, data na qual ele foi demitido) e experimentador de todos os terrenos de certo número de substâncias cujo efeito foi qualificado de psicodélico para permanecermos na arte do eufemismo. Tudo partiu da descoberta maravilhosa dos cogumelos alucinógenos durante uma viagem ao México e do trabalho que se seguiu com a psilocibina, que eles contêm. Leary não descobriu os efeitos alucinógenos do LSD (foi o químico suíço Albert Hoffman nos anos 40, e novamente, sem ser nem mesmo de propósito), mas ele pôs em luzes seus efeitos sobre o comportamento.

 

 

Felizmente, quando ele se foi da terra , o professor Leary tinha seus arquivos: 335 cartões cheios de letras, registros de áudio e vídeos, recortes de imprensa, fotos, contabilidade, posologias e textos diversos. O todo veio a ser vendido por 900.000 dólares a Biblioteca Pública de Nova York. Bela notícia aos pesquisadores! Os tempos (dois anos) de fazer um inventário. Tudo está lá, os agradecimentos por qualquer viagem inesquecível e as decepções. Assim Arthur Koestler, que absorveu algumas mágicas pílulas rosa, lhe admitiu: “Ontem a noite eu resolvi o enigma do universo, mas esta manhã eu esqueci o que era”. Encontramos mesmo detalhes sobre a visita histórica de John Lennon e Yoko Ono a “cama” (Bed in) (Montereal, 1969), experiência na qual juntou Timothy Leary, que procurou se eleger governador da Califórnia contra Ronald Reagan; ele demonstrou cantando em coro “give peace a chance” que Lenon teve a ideia de uma canção adaptada do slogan de campanha eleitoral de sua campanha (“Venha junto, venha agora mesmo, junte-se a festa (party)” – come together). Leary escreveu nesta ocasião que seu “69 foi o momento mais erótico nos anais da raça humana”, mas não sabemos como agarrá-lo com justeza. Ele que tinha convencido muita gente dos benefícios terapêuticos do LSD (devemos a ele o slogan: “Turn on, tune in, drop out” – ligue-se, sintonize-se, caia fora) fracassou em convencer seus compatriotas de sua capacidade para dirigir o Estado.

 

O itinerário de Springfield (Massachusetts) onde ele nasceu em Beverly Hills (Califórnia) onde morreu, não param por aí. Pois, para os que frequentaram este período de tempo, este homem, que para alguns é considerado como um guru, estava sempre à frente uns dez anos sobre seus contemporâneos. Depois de certo número de problemas legais, ele se desviou através da meditação para o que chamou de oito circuitos da consciência. Sete gramas de suas cinzas foram enviadas ao espaço por uma empresa especializada neste tipo de transporte através de um foguete. O artigo do New York Times, que anunciou a novidade da venda dos arquivos, rodeou sua personalidade sublinhando que ela era justamente indefinível tanto há de Zellig nele: ele não é muito do momento do meio-século transcorrido onde não vemos sua sombra plainar. O futuro conservador dos seus arquivos, para as quais não é muito disputado (os anos que elas estão a venda), diz que elas constituem o “elo perdido” para certos estudos sobre os efeitos das drogas, mas quais, exatamente: aquelas dos farmacologistas ou aquelas dos historiadores da literatura?